O artigo 37, inciso XXI, da Constituição estabelece que, exceto em situações específicas previstas em lei, todas as aquisições e contratações feitas pela Administração Pública devem ser precedidas de licitação, garantindo igualdade de oportunidades a todos os interessados. Este princípio é frequentemente interpretado como uma “obrigação de licitar”[1], que só pode ser dispensada em situações específicas: dispensa e inexigibilidade de licitação, conhecidos como métodos de contratação direta.
Contudo, é essencial entender que a dicotomia entre “regra e exceção” não deve limitar o uso da contratação direta. A mera existência da licitação como norma não implica que a exceção deva ser evitada a qualquer custo. Tal visão distorce a lógica constitucional, ampliando indevidamente os cenários de licitação e restringindo os de contratação direta. Em resumo, insistir em licitações quando não são apropriadas é contraproducente.
Licitação e contratação direta são procedimentos que se complementam. Ambos visam assegurar que o governo faça a melhor escolha possível. A contratação direta é prevista justamente para situações em que a licitação não é viável ou não resultaria na melhor opção, podendo ser prejudicial ao setor público.
A licitação é, sem dúvida, o padrão. No entanto, ela só deve ser aplicada quando: a) há possibilidade de competição clara entre dois ou mais fornecedores que atendam às necessidades do governo; b) existe uma competição real baseada em critérios objetivos[2].
É crucial compreender isso para desfazer o mito de que a contratação direta só deve ser usada em circunstâncias raras. Ambos os procedimentos, licitação e contratação direta, são reconhecidos pela legislação como meios válidos de garantir contratações justas, transparentes e eficientes. Não existe uma superioridade entre eles. Se a contratação direta é justificável, não há razão para recorrer a uma licitação desnecessária.
Além disso, a possibilidade de contratação direta não dá carta branca ao administrador público. A nova Lei de Licitações (Lei nº 14.133/21) estabelece um processo rigoroso para a contratação direta, incluindo a necessidade de justificar legalmente a decisão (artigo 72, inciso III). Este processo assegura que o interesse público seja atendido, mesmo sem licitação.
Em geral, a flexibilidade do processo não implica liberdade total na decisão de quando usar a contratação direta[3]. Existem critérios específicos a serem cumpridos, e cada situação de dispensa ou inexigibilidade tem suas próprias condições.
Conclusão Crítica:
A contratação direta, longe de ser um procedimento complexo e temido, é uma ferramenta essencial para a Administração Pública. Em muitos casos, é a melhor opção para garantir que o setor público obtenha o melhor valor pelo dinheiro dos contribuintes. A chave é entender quando e como usar cada procedimento, garantindo sempre transparência, eficiência e o melhor interesse público. A legislação não favorece um método em detrimento do outro; ela fornece ferramentas para que os administradores tomem decisões informadas e justificadas.
por Rennan Barros @liciteiros
[1] DALLARI, Adilson Abreu. Aspectos jurídicos da licitação. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 23.
[2] MENDES, Renato Geraldo; MOREIRA, Egon Bockmann. Inexigibilidade de licitação: repensando a contratação pública e o dever de licitar. Curitiba; Zênite, 2016, p. 56.
[3] FILHO, Marçal Justen. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos: Lei nº 8.666/1993. 18. ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019, p. 475-476.